sexta-feira, setembro 27, 2013

Era uma vez no ... São Jorge


You learn about loss. («Cape Fear», 1991)

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segunda-feira, setembro 23, 2013

Filmes em revista sumária #414


Quem teria sido Murnau durante o resto da sua vida se não tivesse morrido em 1931, a uma semana da estreia de «Tabu», vítima de um acidente de automóvel em Santa Bárbara e quando ia a caminho de um encontro para preparar a adaptação daquele filme a livro? Não se sabe. Mas, certamente, não se perderia na passagem para o sonoro e provavelmente continuaria a ser um dos maiores senão mesmo o maior de todos os realizadores.

Isto vem a propósito de mais uma passagem de «Tabu» pela ‘meca’ da Barata Salgueiro (está anunciado para este Sábado, dia 28); o filme que resultou das aventuras tórridas de Murnau pelos mares do sul e do interesse à época por tudo quanto fosse distante, exótico, indígena e virgem, que é o termo certo e faz de mote a todo o filme, logo desde o 13ª intertítulo da história de amor trágico entre Reri (a actriz foi cirurgicamente recrutada por Murnau num bar de Bora-Bora) e Matahi, quando é dada àquela a grande honra de desposar os ‘deuses’: «Man must not thoch her or cast upon her the eye of desire for in her honor rests the honor of all people».

«Tabu» é também um objecto ‘exótico’ na filmografia do autor de «Nosferatu», um passar da escolástica kammerspiel dos prodigiosos movimentos de câmara e dos décors expressionistas de interiores para o ar livre e para o cenário natural e os seus elementos, e para os actores não profissionais. Foi também uma experiência a quatro mãos (frustrada) com o documentarista Robert Flaherty, autor do celebérrimo «Nanook», no rescaldo de revolta contra a ditadura dos estúdios e que prometia muitas mais colaborações – em certa maneira foi o despontar do hoje celebrado ‘cinema independente’.

Mas «Tabu» continua a ser um cinema intrinsecamente simples e irrevogavelmente triste, só possível a Murnau, e por isso tão belo (a que a câmara do justamente oscarizado Floyd Crosby não é alheia); de alguma forma pagão e «untouched by the hand of civilization».


In O Diabo (24.9.2013)

Por que não cansa ver «The Outlaw»?


Passa pela enésima vez na Cinemateca, desta feita hoje às dez na noite.
Este filme de Hughes não cansa, mesmo.
Sim, a culpa é de Jane Russell e daquele prodigioso zoom do multimilionário sobre ela na palha...

terça-feira, setembro 17, 2013

Filmes em revista sumária #413


Quando Woody Allen resolve desligar o piloto-automático (um risco para quem produz ao seu ritmo), costuma presentear-nos com pequenas pérolas como a que agora se estreou, é protagonizada por uma Cate Blanchett superlativa, e se chama «Blue Jasmine»: de longe o melhor dos seus filmes nos últimos anos, pelo menos desde «Match Point» e porque, além do mais, porque fica um seríssimo nó na garganta.

Não temos Nova Iorque mas temos São Francisco. Não a ‘cidade nua’ dos policiais a p/b, corridas de automóveis e Alcatraz (nesse sentido trata-se agora apenas de uma mudança de cenário), mas uma cidade de personagens reais, com histórias de família que todos conhecemos. Lá estão os diálogos afiadíssimos, como é hábito em Woody Allen, e a sua conhecida arte em dirigir actores que à partida não ‘encaixam’ uns com os outros ou parecem não estar à altura do padrão de qualidade dos filmes por si realizados.

«Blue Jasmine» é todo um drama, digno de novela, mas tem muito humor a pontilhá-lo, inteligente e não poucas vezes subliminar. Não há um único tempo morto nem uma única falha de argumento - e quantas vezes só por isso o cinema do autor de «Annie Hall» nunca cansa. É também um filme em que os homens são secundários (e não o são sempre mesmo quando motivo principal do folhetim?) perante aquela dupla de irmãs adoptadas (fazem sempre questão de o referir) de faísca, quase omnipresente.

Mas «Blue Jasmine» é sobretudo … Cate Blanchett (Óscar garantido?). De facto, a actriz australiana, visivelmente mais velha, nunca esteve tão perfeita quanto como nesta Jasmine caída subitamente em desgraça por força das circunstâncias de um ‘bom casamento’ falhado, e de um snobismo incontinente que a impede de se libertar da neura irreversível, do ‘poço’ onde caiu. A Blanchett transmite uma fragilidade impressionante à sua personagem, aparentemente fútil e superficial por detrás daquele rosto belo, mas indomavelmente poderosa, que faz com que torcemos imediatamente com ela na sua luta por voltar à tona. Porém, ficamos a falar sozinhos.


In O Diabo (17.9.2013)

terça-feira, setembro 10, 2013

Filmes em revista sumária #412


Estreado em Lisboa no extinto Satélite (sala-satélite do saudoso Monumental), em 1972 (antes de 1974 também se estreavam filmes soviéticos), «Alexandre Nevski» serviu a Sergei M. Eisenstein para fazer as pazes com o poder soviete, terminando assim um conflito tortuoso de uma década entre um dos maiores realizadores de todos os tempos – um artista completo – e um regime que sempre o quis espartilhar e moldar, mesmo quando o cobria de honrarias ou assistia ao seu justificado endeusamento no Ocidente.

O filme, feito em 1938, numa altura em que a ameaça alemã já se fazia sentir, não é a obra-prima máxima de Eisenstein (essa será sempre «Ivã, O Terrível», pelo menos a sua 1ª Parte) mas é um filme portentoso e belo, e que foi um instrumento de propaganda muito útil aquando da invasão alemã de 1941, como é óbvio. Os feitos do Príncipe de Novgorod (um dos maiores condottieri da história russa, posteriormente santificado – uma história parecida à do nosso Condestável) no Séc. XIII, contra mongóis, suecos e, sobretudo, contra os cavaleiros teutónicos, serviram às mil-maravilhas à máquina da propaganda para que a alma russa resistisse à Operação ‘Barbarossa’.

Mestre da montagem e de uma sensibilidade estética a toda a prova, Eisenstein fez deste seu primeiro filme oficialmente sonoro um filme de uma fluidez impressionante e de uma imensa carga operática, senão mística (e o poder agradeceu), mas que talvez nunca o pudesse ter sido não fora o sublime P/B da câmara de Tisse (colaborador assíduo de Eisenstein) e a partitura empolgante de Prokofiev (estreante) ou, claro está, esse actor gigantesco (em todos os sentidos) de nome Nikolai Cherkasov.

Neste filme obrigatório em qualquer arquivo caseiro que se preze, há uma sequência inolvidável: a da batalha entre russos e teutónicos na imensidão gelada e terrivelmente branca do Lago Peipus; uma encenação prodigiosa que seria decalcada por muitos e bons realizadores dali por diante. Filmes destes são imortais. Abençoada a Cinemateca Portuguesa que o vai exibindo, incansavelmente - e como seria bom que tivéssemos cinema de reprise nas nossas salas de cinema.


In O Diabo (10.9.2013)

quinta-feira, setembro 05, 2013

Filmes em revista sumária #411


Em tempos de ‘históricas verídicas’ e de crise de argumentistas originais, estreou-se em pleno Verão mais um filme nesta senda, desta feita sobre a carreira, discreta e voluntariamente subserviente, de um mordomo negro da Casa Branca de Washington D.C., na fita chamado Cecil Gaines, inspirado no caso de vida real de Eugene Allen, que serviu vários presidentes norte-americanos por 34 anos – imagine-se a quantidade de segredos e pormenores ‘picantes’ que terá visto e ouvido, mesmo que no seu espírito funcionasse sempre a máxima da profissão: quando estiveres a servir imagina que estás numa sala deserta.

A história tinha tudo para dar certo (a questão racial que atravessa várias décadas do século XX, as peripécias históricas laterais, etc.) mas o filme acaba por ser pouco mais do que duas horas e picos de um omnipresente Forest Whitaker em naturalíssimo underacting (mas longe de ser este o seu melhor papel), uns belos acordes do sempre inspirado Rodrigo Leão e alguns momentos de paródia serôdia à ‘boa’ maneira das personagens burlescas de Eddie Murphy, por exemplo, e tudo é tão cliché que dá mesmo vontade de ir a correr ver a crítica corrosiva que Tarantino fez recentemente em «Django Libertado» por via daquele papel representando por Samuel L. Jackson.

«O Mordomo», de Lee Daniels, é, pois, um daqueles filmes por que se tende a esperar que dê na TV, sendo que pelo meio dele passam várias estrelas em outros tantos papéis absurdos, como Robin Williams a fazer de Ike, Liev Schreiber como Lyndon Johnson (que diacho, o homem seria tão patético?), John Cusack de Nixon (!) e Alan Rickman e uma irreconhecível Jane Fonda a fazerem de Ronald e Nancy Reagan – quem seriam os ‘felizardos’ se Lee Daniels tivesse resolvido retratar também Gerald Ford e Jimmy Carter? Já Oprah é sucesso de bilheteira garantido. Mordomo por mordomo, para os servios respectivos continuarei a pedir Mr. Hudson, perdão, Gordon Jackson, emprestado à «Família Bellamy».


In O Diabo (3.9.2013)