terça-feira, fevereiro 25, 2014

Filmes em revista sumária #442


A ideia por detrás de «Her», o novo filme do criativo Spike Jonze (ex-genro de Coppola), vai por muito para além do simples retrato, mais ou menos premonitório, de um futuro (não tão longínquo assim) em que o homem, ou o que dele restar, é uma marioneta do computador, melhor dito, de um sistema operativo topo de gama, a nível, inclusive, da sua vida sentimental. Nesse mundo, ao alcance de um clique, é mesmo possível apaixonar-se e sentir a «carne» de uma …voz, saída do dito sistema operativo.

Da ideia releva sobretudo o sério aviso feito à navegação: um alerta a todos os viciados em «likes» do Facebook (aqueles que têm milhares de amigos virtuais mas são continuam bichos-do mato na via real) e àqueles com quem nos cruzamos no dia-a-dia e vegetam vidrados no minúsculo écran, jogando ou enviando mensagens entre si, não poucas vezes de auscultadores nos ouvidos, falando sozinhos, até, alienados do que os rodeia.

E se a ideia é boa, o argumento também é, e Joaquim Phoenix volta a ser magnífico, desta vez na pele de um deprimido marido em processo de divórcio, que, profissionalmente falando, é um inspiradíssimo escritor fantasma de cartas de amor (e outras) para clientes que não podem ou não sabem já como escrever a terceiros, muito menos com afectos. Paradoxalmente é ele quem cai na ratoeira comercial do sistema operativo e no engodo sensual da voluptuosa voz de nome Samantha (e que outra voz senão a de Scarlett Johansson…).

Contudo, o que é bom acaba depressa e o filme entra rapidamente em circuito fechado, repetindo-se até se tornar monocórdico e chato. Jonze bem lhe podia ter imprimido algum «restart» mas não o fez. E o final também não ajuda. Moral da história: volta, HAL, estás perdoado, ao menos podiam apagar-te...

quarta-feira, fevereiro 19, 2014

Filmes em revista sumária #441


«Labor Day» remete para aqueles dramalhões, mais ou menos «noirs», dos anos dourados de Hollywood, em que nos narravam (muitas vezes em voz off) histórias de fugitivos, mais ou menos facínoras, de «chain gangs», que se acabavam por anichavar em mulheres honestas, mais ou menos maduras, geralmente sozinhas e com prole. Em «Labor Day» temos Kate Winslet e Josh Brolin, um par de pêso, como naqueles anos tínhamos a Stanwyck e Robert Ryan ou Lupino e «Bogie». E se na trama central como no desempenho de ambos (mais o jovem Gattlin Griffith) o filme não deslustra e cumpre bem o seu papel de entretenimento, já aquele final... só mesmo nos anos 40-50, agora já só em novela. Melhor cena do filme: a da confecção da empada de pêssego.

terça-feira, fevereiro 18, 2014

«Ghost of Mars» (2001), revisão em baixa


Tide's up. Time to stay alive.

Filmes em revista sumária #440


Não fora ter como realizador Stephen Frears e Judi Dench como actriz principal e provavelmente esta crónica sobre «Filomena» não seria escrita.

É que, por mais incrivelmente verídica que seja a história (e na realidade é) que dá corpo e alma a «Filomena» e por maior que seja o entusiasmo (contagiante, por vezes) com que Steve Coogan se dedicou a este projecto (e interpreta a sua personagem de jornalista de acontecimentos do quotidiano), facto é facto, e os nomes acima citados valeram de facto ouro a este filme.

Aliás, só por isso se compreende (mas não aceita) que «Filomena» esteja na corrida aos Óscares, pois, mesmo fazendo parte daquilo que nos vem sendo apresentado recentemente pela Academia como os «dez melhores filmes» produzidos em cada ano, é notório que o filme só por acaso pode constar de um tal lote.

Histórias e dramas de vida mais ou menos parecidos como o aqui relatado, estão mais que vistos e revistos, a começar por aqueles que são filmados em muitas das produções televisivas da própria BBC (aqui co-produtora com o Canal +), se bem que isso não queira significar que não mereçam continuar a ser filmados, longe disso.

«Filomena» é, portanto, um filme simpático, honesto e dedicado, bonito, mas pode perfeitamente ser visto no pequeno «écran».


In O Diabo (18.2.2014)

terça-feira, fevereiro 11, 2014

Filmes em revista sumária #439


J.C. Chandor e Robert Redford (ou será ao contrário?) conseguem a proeza de manter o público agarrado durante 106’ ao que se vai desenrolando em «All Is Lost», ininterruptamente, mantendo-o na expectativa (isso agrava a proeza uma vez que o «trailer» respectivo contava o filme quase todo…) sobre o que irá acontecer ao grandíssimo Redford (e ele já soma quase 78 anos de idade!), à deriva naquela imensidão do Índico, à medida que as hipóteses deste homem do mar sobreviver e de chegar a bom porto, vão caindo por terra, incidente a incidente, por força dos elementos ou, simplesmente, por pouca sorte.

A presença física, ou melhor, o corpo de Redford está por todo o lado (como quase sempre está, aliás) e sem duplos, resistindo e recuperando das sucessivas adversidades, e todos os que assistem a este belíssimo filme partilham da sua angústia, primeiro, da sua persistência, depois, e, finalmente, da sua desistência.

A fotografia, a montagem, a música (produzida em parte pelo líder dos Magnetic Zero!) e, sobretudo, os magníficos efeitos especiais sonoros fazem deste filme corajoso (trata-se de um filme só com um protagonista e sem diálogos) e sobre a coragem, uma das mais agradáveis surpresas do ano, de que Hemingway, por exemplo, teria gostado. Em relação ao realizador, J.C. Chandor, que nos deu há 4 anos um também surpreendentemente e fabuloso «Margin Call», já se espera uma terceira boa surpresa, pois então.


In O Diabo (11.2.2014)

Obituário: Gabriel Axel (1918-2014)


E só pela «Festa de Babette» mereceu logo aí um lugar muito especial na história do Cinema; um filme inesquecível.

Obituário: Shirley Temple (1928-2014)


Da menina-prodígio, actriz, cantora, dançarina, política activa e embaixadora, hei-de guardar com particular carinho os filmes dos anos 30 da RTP de serviço público, ainda que a preto e branco. Era de facto única, a Shirley Temple, mais o seu sapateado e aqueles diálogos vivaços com Bill "Bojangles" Robinson.

terça-feira, fevereiro 04, 2014

Filmes em revista sumária #438


Paródia negra, desinibida, extravagante, despretensiosa, imune à crítica de cachimbo e poltrona; esta «Golpada Americana» de David O. Russell lembra as memoráveis comédias inglesas de antanho (de que Mackendrick foi mestre) e do inimitável «scoundrel», aquele pequeno e médio empresário sempre pronto a enganar o próximo, nem que seja traficando ouro dentro de pequenas torres Eiffel, como em «Roubei Um Milhão», com o impagável Alec Guiness (sempre). Aqui, contudo, o tom é muito mais básico, primário, mesmo, afinal remete para o gangsterismo político e para as investigações do FBI dos anos 70. Mas há mais cor, também, porque tudo decorre como por debaixo de uma bola de espelhos, ao ritmo da «disco sound» dos anos loucos da 2ª metade do século passado.

David O. Russell deixa correr o marfim, bem, sem grande vontade de transmitir mensagens seja a quem for, agradar a este ou àquele; quem viveu aquele tempo, viveu, quem não viveu, paciência, que o filme é o que é e é suficiente: um filme de personagens (em certa medida até lembra Pirandello e as suas 6 personagens) loucas, exibicionistas, apaixonadas, mas personagens que nunca chegam a andar à solta, que o autor de «Os Três Reis» não deixa.

E é um filme de actores (que mal há nisso?) e que actores – Óscares, vá lá, para o Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence, S.F.F., e para Jeremy Renner, se sobrar algum das outras categorias em apreço…

Inesquecíveis, são já a barriga e o penteado criativo de Bale (autêntica arquitectura capilar), a permanente de Cooper (num agente FBI, não sei não…), a poupa de Renner (digna da «mob» de Atlantic City) e, claro, os atrevidérrimos decotes Gucci de Amy Adams, a arrasarem, previsivelmente, toda e qualquer concorrência na corrida às estatuetas no Dolby Theatre. A melhor sequência é a da lavandaria, com o par de apaixonados enlaçados dentro de uma fileira de cabides a rodar sem parar, melhor era impossível.

Nota final: o elenco de «Boardwalk Empire» continua de vento em popa.


In O Diabo (4.2.2014)

segunda-feira, fevereiro 03, 2014

Obituário: Maximiliam Schell (1930-2014)


Schell, que foi tão grande actor (também foi argumentista, realizador e produtor) quanto melómano praticante (compositor, maestro…), tinha um daqueles rostos, à semelhança de Cassavetes, por ex., que não se esquecem nem ignoram, antes irradiam carisma. Curiosamente, Schell, haveria de ficar marcado por papéis dicotómicos passados no decorrer e no pós-2ª Guerra Mundial, fosse como oficial da Wehrmacht ou espião duplo (e que grande papel em «Deadly Affair»!), fosse como caçador de nazis ou advogado do diabo (valer-lhe-ia o Óscar em «Julgamento de Nuremberga», 1961). No fim, cá para mim, descontados os inúmeros desempenhos enquanto actor secundário de filmes mais ou menos dispensáveis, e outras tantas séries televisivas menores (salvo, talvez, «Pedro O Grande», em 1986), talvez o seu papel maior tenha sido o de Arthur Goldman, a terrível personagem escrita por Robert Shaw para «The Man in the Glass Booth», por ele protagonizada em 1975, sob a direcção de Arthur Hiller. Maximilian juntou-se agora à irmã Maria, desaparecida em 2005...

Obituário: Philip Seymour-Hoffman (1967-2014)


Uma pena. Um desperdício.
E faço minhas as palavras de AA, orador precedente.