segunda-feira, abril 09, 2007

Arte na pantalha


Ele aí está, «INLAND EMPIRE», a mais recente aventura alucinante de David Lynch, de veia ainda mais abstracta que nunca; alegoria perfeita sobre o modo de nos encontrarmos e salvarmos a nós mesmos (esse vasto território que serve de título paradoxal ao filme) e aos outros, desde que ... devidamente ajudados por terceiros de sotaque eslavo e aparência suspeita. É o regresso do autor de «Blue Velvet» aos nossos cinemas, se bem que desta vez as obsessões sejam mais do género «Eraserhead» do que propriamente de narrativa mais simples. É também o regresso de Laura Dern. E que regressos!

Lynch está igual a si próprio, ou seja, exímio na manipulação e tratamento das imagens (e que soberba se mostra a câmara digital quando manejada por um realizador como Lynch ou Bergman), na iluminação (aquele plano de Kitty, iluminada como um anjo é de chorar por mais...) e nos filtros (veja-se aquele assombroso plano desfocado da cara, do mal puro, do vilão-explorador de raparigas, derretendo-se com os tiros) na posição da câmara, na abertura do diafragma (aqueles «close-up» dos rostos, dos olhos, são qualquer coisa de notável), na direcção de actores, na narrativa (em osmose), na capacidade de pôr os neurónios-espectadores a trabalhar, recusando-lhes o pão-pão, queijo-queijo.

E que dizer de Laura Dern, senão que está soberba no papel de uma actriz, prisioneira enquanto mulher, que de um momento para o outro, ao candidatar-se a certo novo papel passa a salvadora de alguém nas mesmas circunstâncias, mas num mundo e época diferentes, por entre mil e uma hipnoses, cenários falsos e armadilhas do faz-de-conta, num jogo de ilusões e violência, como só Lynch é capaz. Um papel extraordinariamente difícil e mais uma experiência inolvidável.

Melhores cenas: a cena de amor, debaixo do edredon azul, em que tudo se adivinha e nada se vê para além da pele, e tudo o mais se ouve; a porta abrindo-se para Dern e para a rua na Polónia, depois da conversa de mulheres, acompanhada com uma música verdadeiramente sublime; o julgamento no limbo, lá em cima, com um decisor que fala ao telefone com Alguém; a cara de Dern, rodando para o canapé, seguindo o indicador da oráculo-polaca. Único senão: saber a pouco. Um doce a quem descobrir o «cameo» de Nastassia Kinski.

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