terça-feira, março 04, 2014

Filmes em revista sumária #443


Ver Roma e depois morrer, reza o adágio. Mas… será que já só há «mortos» por detrás de tamanha beleza e ninguém ainda se apercebeu disso?

O mote para este grandíssimo filme de Paolo Sorrentino salta-nos antes do genérico inicial, com o turista japonês que mira a cidade eterna desde a Fonte de Água Paula, na colina de Gianicolo, e que cai para o lado, fulminado por tamanha beleza. «Raccord» imediato e eis-nos no meio de uma festa frenética na cobertura de um prédio, sob o olhar da Martini (e que outra marca poderia ser?): a festa dos 65 anos de Jep Gambardella, personagem central e rei dos mundanos.

E se «A Grande Beleza» tem semelhanças evidentes com os filmes de Fellini («Dolce Vita» à cabeça), pelo caricato de algumas das personagens, pela «socialite» em contínuo estado de embriaguez psíquica, etc., há também um forte tom lynchiano (já presente no filme anterior de Sorrentino) que contrapõe a esse lado burlesco, optimista, «vivace» e romano do filme, um vórtice de profundo desencanto, uma nostalgia exasperante, a impossibilidade da fuga, a tragédia do faz-de-conta.

«A Grande Beleza» é um tratado sobre a decadência (que também é arte, não?), criação do homem (divina?), e sobre o labirinto de como se aceder à verdadeira beleza, à que não passa nem por cirurgias plásticas nem por fatos à medida, artistas de vanguarda e moralistas de partido. À que está fechada a «sete chaves» mas à guarda de alguém misterioso, elegante e… coxo. À que só os bafejados pela capacidade de peregrinarem às raízes do «eu» conseguem almejar.

Sem dúvida alguma que «A Grande Beleza» é um dos grandes filmes italianos dos últimos anos (muitos). Conta com um Toni Servillo absolutamente fabuloso, e sequências inteiras de se ficar sem fôlego (nós e ele), graças a ele e a um idioma único, uma banda sonora que remete para a Carrà, uma cenografia exemplar (dentro e fora do «plateau») e a …Roma. Façam favor de ficar até ao fim do genérico final, ponte sob ponte do Tibre.

Resumindo: uma «bellezza da morire».


In O Diabo (4-3-2014)

3 Comentários:

Blogger Ricardo António Alves disse...

Já tinha vontade de ver; a tua crítica aumentou-a.
Abraço

3:16 da tarde  
Blogger Paulo Ferrero disse...

É mesmo muito bom. Obrigado, Ricardo! Abraço

12:33 da manhã  
Blogger Julio Amorim disse...

Hummm....mas que menu delicioso. "A pobreza não se fala...vive-se". Pois, pois....para ver e rever (e voltar). Roma, Roma....

12:01 da tarde  

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