terça-feira, junho 17, 2014

Filmes em revista sumária #457


Que o cinema indiano tem especial queda para o melodrama, que mete grandes histórias de amor, regra geral dificultado por entrave familiar ou social, mais contradições cidade-campo, etc.; disso ninguém nunca teve dúvidas, e bastaria uma espreitadela aos clássicos de Satyajit Ray (mais inspiração, menos inspiração nos escritos do laureado Tagore) para quem disso duvidasse tirar a efectiva prova-dos-nove, e as coloridas e sempre bem engalanadas super-produções de Bollywood estão aí para o provar, mais ou menos «ad nauseam».

Eis, contudo, que, desse imaginário digno de Taj Mahal, aparece agora «A Lancheira», vinda directamente da grande Bombaim, dessa imensa metrópole de comboios apinhados e engarrafamentos vários, ainda que com certo «cheirinho» à chancela do Canal ARTE.

A marmita, que dá título ao filme e que se extravia a certa altura (culpa de Parvati?), no meio de uma sofisticada logística que suporta o refinadíssimo serviço de entregas, Dabawallahs, e que Harvard quer imitar; serve de cupido a quem parecia já se ter resignado a nunca mais reencontrar o Amor.

A marmita; na verdade um conjunto de pequenas marmitas metálicas, encavalitadas umas nas outras, mas recheadas de um manjar capaz de estoirar com toda e qualquer produtividade (conceito em oposição clara ao das nipónicas e espartanas «bento»), mais não é do que o tal «comboio errado que nos pode levar ao destino certo».

A genialidade deste filme reside tanto na sua simplicidade como no modo como nos convence que o mundo, apesar de tudo, não está perdido, e que no meio da globalização e das novas tecnologias, no que toca, pelo menos, ao serviço de reclamações de certa repartição, e, pelo mais, ao Amor; ainda há espaço, tempo e modo para a missiva em papel. Tudo com humor e sensibilidade. Convenhamos que não é pouco.

O estreante Ritesh Batra, argumentista e realizador, está de parabéns, tal como o estão Irrfan Khan e Nimrat Kaur (no amor por correspondência), e os secundários Nawazuddin Siddiqui (ele rouba todas as cenas em que entra) e a voz da Tia, vizinha de cima de Illa.


In O Diabo (17.6.2014)

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