terça-feira, junho 24, 2014

Filmes em revista sumária #458


Mais do que assistirmos à paixão melancólica entre Adão e Eva, o par de vampiros diletantes e eruditos que protagoniza este melodramático «underground» intitulado «Só os Amantes Sobrevivem», o que interessa reter para a posteridade é que, afinal, os escritos do velho bardo de Stratford-upon-Avon não foram escritos por este mas sim por um vampiro (!) de nome Campbell, interpretado no filme pelo sempre superlativo John Hurt.

Mais, ainda, a realidade histórica que nos tem sido administrada ao longo de décadas já não é o que era, passou a ficção virtual, senão veja-se: os vampiros são, eles sim, os responsáveis pela evolução do conhecimento e da espécie humana. As descobertas científicas, a poesia de génio, a música, etc. (e o futebol?), que originaram carreiras e patentes inolvidáveis foram, antes, obra de vampiros (supõe-se que de alguns eleitos…), e não de quem nos dizem ser nos calhamaços enciclopédicos; esses mais não foram (e continuam a ser) que «zombies». É o mundo às avessas? Sim, mas é divertido.

Pelo meio daquele visual gótico irrepreensível, de influência claramente germânica, e daquela «música de enterro» (belíssima, aliás), os humanos são tão «zombies» que eles próprios se têm encarregado de contaminar das mais variadas formas (drogas, poluição, químicos, tráfico, o abandono de cidades, fábricas, cinemas…) a própria espécie, pela incontinente conspurcação do precioso líquido vermelho que lhes (nos) corre nas veias e tonifica os vampiros, acabando antes por os matar, eles a quem só uma estaca de madeira cravada no coração ou um raio de Sol matava.

Paradoxalmente, contudo, está na inocência dos humanos ainda puros (por inerência no Amor), o milagre de garantir «ad aeternum» a sobrevivência do génio vampiresco.

O rosto andrógino de Tilda Swinton ajuda ao festim de melancolia em que o filme se desenrola, os «décors» também, mas o grande trunfo do filme de Jim Jarmush (ou será de Jozef van Wissem?) é mesmo a sua banda sonora, pelo que prateleira com ela, já.


In O Diabo (24.6.2014)

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