terça-feira, dezembro 02, 2014

Filmes em revista sumária #480


Já vai longe o tempo em que havia que estar no local certo à hora certa para se ter a notícia em cima do acontecimento, e quem diz isso diz a fonte fidedigna que possibilitava o maior dos exclusivos. A disputa mediática sobre quem consegue o melhor “furo”, em horário nobre ou em directo (melhor ainda), está para durar, basta vermos as notícias de abertura dos telejornais, as manchetes dos jornais (e a coisa já não é exclusiva dos pasquins). A culpa será do mercado que é, como quem diz, de que quem as vê e devora qual animal de rapina: nós. E se os criadores dos factos políticos estão ao virar da esquina, já pouco falta para nos rendamos a quem fabrique a sua própria notícia, tal o mundo-cão a que chegámos.

Daí que «Repórter na Noite», realizado por Dan Gilroy (argumentista de filmes de acção e marido de Rene Russo), provoque um amargo de boca constante, porque “aquilo” (o filmar em cenário real os estoiros de carros, o sangue a jorrar, os estertores das vítimas, etc.) não acontece já só na L.A., na distante do Tio Sam mas entra-nos diariamente pela sala adentro, desde o dia em que as “cenas eventualmente chocantes” deixaram de o ser e de justificar a mínima censura que fosse de quem edita as notícias. O mundo da guerra de audiências virou, redundantemente, global e o espectador está preso no vórtice da tempestade. É a realidade nua e crua dos tempos que vivemos. Prova disso é que as duas horas do filme passam que nem milésimos de segundo, ainda que o silêncio à saída da sala seja sintomático do que se viu.

Mas, pese embora a actualidade da temática em apreço e a câmara segura de Gilroy, é Jake Gyllenhaal que vale quase todo o filme, evidentemente. Ele é um actor extraordinário e só talvez ele é que nos podia fazer ter empatia por aquela criatura predadora, necrófaga, esquálida e terrível, que não olha a meios para atingir os seus fins, leia-se, o seu negócio próprio, viável e sustentável, como se diz. Um empreendedor, na verdadeira acepção do termo.


in O Diabo 2.12.2014

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