terça-feira, dezembro 22, 2015

Filmes em revista sumária #526


«Mocidade, mocidade, porque fugiste de mim, hoje vivo de saudade, como é triste perdermos a mocidade, sentimos que é o princípio do fim», cantara António Calvário pelos idos de 70, já antes Tony de Matos lamentara: «Oh tempo volta para trás, dá-me tudo o que eu perdi, tem pena e dá-me a vida, a vida que eu já vivi».

Palavras sábias que em «Juventude» - o novo filme do napolitano (por isso charge-homenagem a Maradona, “rei de Nápoles”), do profundamente romântico e cínico (quiçá por isso politicamente incorrecto) Paolo Sorrentino, no pós-opera-prima de «A Grande Beleza» - ganham forma na velhice inquieta de corpo e mente de dois amigos octogenários, ambos maestros da régie, que se encontram a retemperar forças (e inspiração) numas termas alpinas de sonho que lembram A Montanha Mágica, de Mann, pelas personagens, aqui e ali fellinianas, pela magia, onirismo, decadência, etc., espartilhadas pela morte, por via da tuberculose, no livro, pelo excesso de melancolia, no filme.

Sorrentino está em forma (ufa) neste seu novo e belíssimo filme, maravilhoso por vezes (ai aquelas pinceladas à la Greenaway, com os clientes anónimos do spa a desfilarem silenciosos, estáticos, como se fossem figuras saídas de um De Chirico! Eles e elas, novos, velhos, gordos, magros, bonitos, feios, na sauna, na piscina, na sala de jantar, na esplanada, no parque, nos quartos), e que fica na retina também pela fotografia esplendorosa de Luca Bigazzi e pela banda sonora do sempre inspirado David Lang, ambos habitués de Sorrentino.

Michael Caine e Harvey Keitel encaixam que nem uma luva nos dois amigos veteranos com histórias para e por contar, numa dupla que aparentemente podia desequilibrar em favor do inglês. Rachel Weisz e Paul Dano protagonizam cenas de antologia com Caine, ela na terapia de lama, ele na da citação a Novalis (somos sozinhos com tudo o que amamos). Uma desbocada Jane Fonda mete no bolso os poucos minutos onde entra e segue para a Academia…

O filme mexe connosco, talvez tenha nus a mais e seguramente substrato a menos. Para repetir o precedente faltam-lhe uma história mais profunda e, porque não, o ser falado em italiano.


In O Diabo (22.12.2015)

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