Filmes em revista sumária #464
O belíssimo «Ida» marca o regresso de Pawel Pawlikowski aos nossos cinemas e não podia marcá-lo de forma melhor, num filme em que o silêncio vale ouro e não é preciso dizer muito mais, e o preto e branco é uma palete de matizes que condiz a preceito com o estado de alma de um povo, o polaco, do pós-guerra, marcado indelevelmente por um passado ainda recente em que a sua consciência vincademente católica precisa de ajustar contas com a forma como tratou o judaísmo por alturas da 2ª Guerra Mundial.
«Ida» retrata de forma visceralmente comovente os sacrifícios de uma jovem noviça, cuja Fé é posta à prova em vésperas de professar votos; primeiro, lidando com os demónios da sua própria tragédia familiar, depois, provando das experiências de vida de que há-de abdicar inapelavelmente quando professar aqueles.
Um filme que, face ao niilismo generalizado, só podia ser polaco e que lembra imediatamente Bergman, claro, mas também, e muito, o cinema em estado puro de um David W. Griffith, no sufoco dramático em que as duas personagens femininas se desenvolvem (curiosamente as actrizes que interpretam os dois papéis centrais chamam-se Agata e Wanda, e a tia, protagonizada por Agata Kulesza é toda um papelão digno de uma Magnani…), na carga emotiva, épica, mesmo, da história e nos planos soberbamente recortados, tirados a regra e esquadro, assentes numa fotografia tão prodigiosa quanto pouco convencional (vejam-se, por exemplo, as vezes em que os rostos das personagens saem deliberadamente da objectiva, desequilibrando o centro do enfoque daquela – magnífico!).
Um filme que parece querer dizer que, para a nação polaca, Coltrane e o “jazz” norte-americano levaram a melhor sobre a 41ª de Mozart e o «Invoco-Te, Senhor, Jesus Cristo», de J.S. Bach, mas onde, no fim, para Ida, “apenas” lhe permitirão afirmar resoluta: estou pronta, Senhor.
2 Comentários:
Parabéns, Paulo! Abraço
Obrigado, Artur, abraço!
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