quarta-feira, novembro 26, 2014
terça-feira, novembro 25, 2014
Filmes em revista sumária #479
Mais coisa menos coisa, «Interstellar», que marca o regresso de Christopher Nolan e do mano mais novo, Jonathan, autores do fabuloso e originalíssimo «Memento» (2000), vale por ser uma boa homenagem ao filme dos filmes de ficção científica (pelo menos), que dá pelo nome de «2001: Odisseia no Espaço» (1968), de mestre Kubrick. Só por isso vale o bilhete e as suas quase 3h.
Pelo menos na parte que toca à acção no espaço (expurgadas do caricato das cenas e da personagem de Matt Damon, dignas das comédias loucas de Leslie Nielsen - e não falo em Michael Caine por respeito…), que está lá toda: o desenho das naves, o incontornável do computador de bordo, a simbologia do célebre monólito, a travessia de buracos negros e galáxias, a relatividade do tempo e do espaço, etc. Já a preparação da “coisa” no planeta Terra e a história de amor de «Interstellar» deixam bastante a desejar e não são para aqui chamadas.
E vale também pela exploração espacial e poética, ainda que aos ziguezagues (o que é habitual nos irmãos Nolan) e apesar de se tentar mostrar um filme cerebral e científico (tem consultoria do físico Kip Thorne). O pior é que a tese vai sendo construída e transmitida atabalhoadamente e confusa (talvez tivesse sido bom ir espalhando uns post-it aqui e ali) pelo que atrapalha e muito, desde logo o próprio filme.
Visualmente assombroso, neste filme há de novo lugar ao “céu” que desaba sobre Christopher Nolan (foram os arranha-céus, em «Inception», agora são as ondas), sendo que o momento mais conseguido é a cena, decalcada do apagão a HAL, em que pai e filha coincidem no tempo e no espaço, separados por uma teimosa estante do conhecimento. A música de Hans Zimmer (quem mais?) vale outro tanto de «Interstellar». Isso e McConaughey e a Chastain, claro, dois actores extraordinários e que já têm o mundo a seus pés.
O futuro está nas estrelas? Talvez. O problema é que equação se vai tornando rapidamente em inequação. De qualquer forma nunca estaremos cá para saber.
In O Diabo (25.11.2014)
terça-feira, novembro 18, 2014
Filmes em revista sumária #478
O problema de «As Duas Faces de Janeiro», que marca a estreia por detrás da câmara do anglo-iraniano Hossein Amini, até agora argumentista de algum sucesso, é ter (parecer) tudo tão bonitinho e perfeitamente alinhado que enjoa.
Rodar-se um filme em locais deslumbrantes, desfrutar-se de um trio de actores de eleição como Viggo Mortensen, Kirsten Dunst e Oscar Isaac, ou de um compositor como Alberto Iglesias (ou será… Bernard Herrmann?), e de um texto-base da autoria de um consagrado como Patricia Highsmith, profusamente adaptada ao cinema, tudo isso pode não ser suficiente para fazer a diferença, e aqui não fez, infelizmente.
Ele há estilo, bom gosto, anos 60, planos muito bons e, claro, cinefilia a rodos para dar e vender, mas falta-lhe qualquer coisa que o resgate do «suficiente +». Faltou pulso a Amini, enquanto realizador, para atingir o cerne da questão: a profundeza de alma daquelas três personagens envolvidas naquela história de encadeamento de vigarices, devaneios, identidades trocadas, recalcamentos, luta de galos, crime e castigo; tragédia, grega. Ou seja, faltou-lhe o que sobrava a Hitch, por exemplo, quando fez o que fez de uma história similarmente curta e aparentemente simples chamada «O Desconhecido do Norte Expresso»: um marco cinematográfico.
«As Duas Faces de Janeiro» anda, pois, um pouco à deriva, mas é um filme simpático e honesto de aventuras e suspense, ainda que mero postal, aqui e acolá; por vezes bastante interessante e que não deixa quebrar nem que por instante, a empatia com o espectador, pelo menos com quem gosta de policiais. Um filme que é levado às costas por Viggo Mortensen, cada vez mais melhor actor, aliás aqui num misto de Mr. Ripley e Hidalgo, ora seja com Isaac ora seja com Dunst.
Resumindo e concatenando: vê-se bem mas podia ser melhor, muito melhor.
in O Diabo (18.11.2014)
sábado, novembro 15, 2014
sexta-feira, novembro 14, 2014
terça-feira, novembro 11, 2014
Filmes em revista sumária #477
“Duas Vidas”, realizado pela dupla Georg Maas e Judith Kaufmann, não é um filme sobre o Programa Lebensborn (“fonte da vida”), o projecto tenebroso que Himmler idealizou e levou à prática durante 10 anos, promovendo a procriação de crianças entre oficiais militares alemães e mulheres dos países então ocupados (leia-se arianos…) pela Wermacht, permitindo àquelas o darem à luz secretamente, longe da reprovação dos seus conterrâneos - as crianças, depois de “educadas”, eram dadas “criteriosamente” para adopção. Mas antes o tivesse sido porque teria dado um filme muito mais interessante.
Em vez disso, o filme aborda o tema pela rama (talvez porque o trauma do dito cujo esteja ainda profundamente presente na sociedade norueguesa) e volta-se para uma narrativa de espionagem banal, no cenário do pós-queda do Muro de Berlim. Aliado ao facto da realização (demasiado telegénica – a co-realizadora também é a responsável pela fotografia) e a montagem (satura tanto “um passo à frente, dois atrás”) não serem as melhores, nem as interpretações, já agora (Liv Ullmann incluída), «Duas Vidas» cedo fica a perder pela opção feita ao enveredar numa história atabalhoada e algo ridícula, por vezes.
Seja como for, continua a haver dois filões cinematográficos chamados 2ª Guerra Mundial e “espionagem à volta do Muro”, pelo que o filme consegue manter-se à tona e manter o interesse do espectador incólume até ao epílogo, inevitável. Isso e os belíssimos cenários reais daquela Bergen e daquela estrada entre ilhas.
Resumindo, Lewis Milestone e Errol Flynn podem continuar descansados: “Um Raio de Luz” (1943) continua a ser o melhor filme sobre a Noruega resistente, que o foi, essencialmente.
In O Diabo (11.11.2014)
sexta-feira, novembro 07, 2014
terça-feira, novembro 04, 2014
Filmes em revista sumária #476
Sinais dos tempos: os meninos continuam rabinos mas na hora da deita, quando há que apagar a luz e o sono já espreita, os livrinhos de história já não são o que eram nem conseguem o que dantes conseguiam. Resultado: não há mãe que a tanto resista, ao pesadelo real de não conseguir dormir nem fazer com que o filho Samuel o faça. No fim quem se trama é o cão.
Esta podia ser a sinopse, bastante injusta, de «O Senhor Babadook», o filme australiano de terror psicológico que Jennifer Kent escreveu e realizou, e Essie Davis e o pequeno Noah Wiseman interpretam de forma soberba. Eles e a personagem terrífica que dá título ao filme e que mais não é do que o próprio desaparecido feito lobo feroz imaginário dos três porquinhos (aqui dois), numa espécie de cruzamento de Mr. Penguin com Nosferatu, fruto assombroso dos medos, traumas e complexos de ambos, e das culpas a que se atribuem reciprocamente, mãe e filho.
No filme, que é rodado todo ele, praticamente, em huis clos e decorado a cinzentos e azúis (é magnífica a fotografia do polaco Radek Ladczuk), onde só há «princesas» e os homens parecem ser doutro mundo, há uma grande história de terror à oriental para contar, onde os inevitáveis alçapões e o ranger da madeira, mais as respetivas pancadas de entrada em cena e uma música impressiva, convivem em pé de igualdade com uma reflexão honesta sobre o mundo que nos rodeia: a família, a solidão, a velhice, o sentimento de perda, as falsas amizades, a degenerescência, e tudo o mais que se sabe.
O cinema australiano continua a dar cartas e aqui está uma história com moral e um final feliz, a que só cada qual poderá aquilatar por si próprio quando tiver idade suficiente para descer à cave. Bingo para Jennifer Kent!