quarta-feira, maio 31, 2006

«Les 400 coups», logo pela manhã

No Dia Mundial da Criança, a primeira criança que vejo na via pública é um vivaço, com cara de Antoine Doinel, cravando um cigarro ao engraxa da esquina, que, depois de lho dar, lhe pergunta: "não tens idade para fumar, pois não?". E o puto lá seguiu, gingando passeio acima.

Fazer das tripas coração

Brevemente terei que me deslocar ao El para ver o melhor filme em cartaz. Isto nao se faz, Sr.Branco!

Depois da débacle, que me resta pelas manhãs?



Tu, pintada por Lempicka.

terça-feira, maio 30, 2006

Pb nas asas

Depois do monóxido da carbono veio o Pb, on behalf of his excellency, MP. Paciência, que se dane o Shaw mais os pedófilos da câmara de lobos. Damn you all and see you later.

Obituário: Shohei Imamura (1926-2006)

Não era um gigante do cinema nipónico como Ozu, Mizoguchi ou Kurosawa, mas esteve sempre na linha da frente do segundo pelotão, de Kobayashi a Oshima. Ao fim de 79 anos ficam as suas crónicas em jeito de crítica enérgica e corrosiva à sociedade nipónica, sempre com muito humor e imaginação, especialmente marginalidade e submundo adentro. Foi um independente à sua maneira. Domo arigatou gozaimasu, Imamura-san!

Mais valem 5 min. em cima daquela moto do que uma eternidade ...

«The World's Fastest Indian» é o típico filme feito a partir do relato de a man and his dream, levado à tela por um realizador competente e low profile, e corporizado num fabuloso e carismático actor que ainda tem muito a dar ao cinema: Anthony Hopkins (a amizade entre ambos vem do tempo de «The Bounty». Que seria do filme sem ele, e sem a sua interpretação do neo-zelandês Burt Munro, que viveu obcecado com a vertigem da velocidade em moto, e em provar que velhos são os trapos? Nunca saberemos ao certo, mas talvez o filme não chegasse a passar a fronteira do biopic televisivo...

O filme tem muitos clichés, é certo, mas nenhum deles chega a ferir susceptibilidades, tal a empatia (mesmo simpatia) que se produz imediatamente entre a personagem central, a sua tenacidade, a sua loucura, e o espectador. O ritmo do filme, ao contrário da Indian que lhe dá nome, é pausado, e as personagens são consistentes q.b. face à natural omnipresença de Hopkins. A história é verdadeira e só é pena que em vez da moto não tivesse sido o «incontornável» e mítico Bluebird, de Campbell, a ser objecto de atenção por parte de Donaldson e de Hollywood...

segunda-feira, maio 29, 2006

Nada tenho que ver com Gaslight


Há excesso de monóxido de carbono lá por casa e demais andares do prédio. Gás cortado, portanto. Mas eu juro a pés juntos: não sou Charles Boyer, e muito menos tenho alguma coisa que ver com a ficha técnica do fabuloso filme de Cukor.

Quem diria que volume em excesso dá sono?

No título em inglês e português deste «X-Men III» é-nos anunciado como sendo o «confronto final», o que sendo dois reforça mais a coisa. Assim seja, para se acabar com suplícios de hora e meia de super-poderes nonsense, em guerras entre mutantes e humanos (vá-se lá saber onde pára a fronteira) inúteis e perfeitamente estéreis. O filme é pura macadada f/x às três pancadas, e não é de certeza com filmes como este que a banda desenhada homónima ganha mais leitores, muito pelo contrário. Os actores, esses andam ao Deus-dará. Que tamanho desperdício de dinheiro!

Sob o ataque de insectos


Boiando nas águas entre 3 palácios, dei-me conta da invasão de mosquitos, aranhiços e mosquinhas minúsculas (dizem-me que provenientes da costa africana, quiçá se em remake do IARN?). O certo é que passaram num ápice da água temperada à areia escaldante, e dei graças por não estar na década de 50 e não ser figurante de «The Incredible Shrinking Man» (1957), ou de «Them» (1954).

Cannes versus Cans

Enquanto um Ken Loach politicamente correcto ganhava a palma a Sofia e a Pedro, em Cans, terra galega por excelência, decorria um originalíssimo festival de curtas, aproveitando as semelhanças fonéticas entre os dois locais. Originalidade de raíz lusitana?

sexta-feira, maio 26, 2006

Para mim já ganharam!

Esta foi a tua reacção à notícia que dá conta de Dolce & Gabbana vestindo a Squadra Azzurra para o Mundial da Alemanha, em contraponto com Fátima Lopes e a selecção das quinas.

Ontem, dei por mim na Viena do pós-Guerra


Ontem, perto da meia-noite, sob a ombreira da porta de um velho prédio da Johannegasse, em Viena, quase por cima dos esgotos mais célebres da Europa, um gatinho malhado lambia-se afincadamente, por entre um colosso negro, apenas iluminado no rosto. Olhos e sorriso desafiantes: o terceiro homem. A cítara de Karas arranca, Orson Welles esmaga-nos!

Quem pensa pouco erra com frequência

Ainda sobre o código, quem melhor do que Leonardo para nos iluminar?

A menina Coppola foi vaiada em Cannes


Parece que anda muita excitação pela banda dos correspondentes portugueses em Cannes (o sol filtrado, o calor húmido, a areia suja, o excesso de ostras e farinatta faz destas coisas...). E eu, bruto assumido, digo que deviam ter vergonha. Porquê? Porque vaiar-se a autora de «Virgin Suicides» e «Lost in Translation» é faltar-se ao respeito a quem nos deu duas das raras obras-primas do novo cinema americano, que é como quem diz, mundial. E, embora não tenha visto ainda o filme, apostava já como este seu «Marie Antoinette» seria uma terceira obra-prima, aplaudidíssima por todos, não fora o caso de ter enxofrado os franceses (primeiro Delon, até), que se acham feridos por ouvirem algumas verdades ... e caso isso não tivesse acontecido, como seria o eco em Portugal? Ela é uma rapariga de bom gosto e o bom gosto não se perde de um momento para o outro, ao contrário das simpatias.

This suspense is killing me

Foi já há um mês. Primeiro foram a-bê-cê-dê, um-dois-três, Orlando Ribeiro, Jorge Miranda e João Lobo Antunes. Depois, ei-bi-ci-di, one-two-three, Robin Cook e Bernard Shaw.

quinta-feira, maio 25, 2006

Soy Quijote de un tiempo que no tiene edad?



Apelidaste-me carinhosamente de Quixote. Livrei-me do Sancho Pança de um passado distante. Mas, não podendo ser Dulcineia, serei eu Roncinante? Em Espanha? Castela, sempre. No cinema? Pabst, sempre.

quarta-feira, maio 24, 2006

O Código não é para levar a sério, OK?

Nota prévia: Alguém explica, s.f.f., a todos os espectadores de filmes por aí que um filme é apenas isso, um filme?! E que quando não é documentário é ficção?!

Dito isto, há que referir que o «Código Da Vinci» não é tão mau quanto o pintam. Por mais que Leonardo, Constantino, os Templários, a Maçonaria, Maria Madalena, os cabalistas e tutti quanti dêem voltas na tumba, o certo é que a culpa é mesmo de Dan Brown, e do seu livro homónimo, livro que também sendo ficção foi lido como se da verdade histórica se tratasse. Tão entendido assim foi que, pasme-se, a própria Igreja, mais um sem-número de instituições, peritos, etc., vieram a terreiro defender a honra da casa, como se os pobres leitores fossem mentecaptos. Agora fazem o mesmo com o filme de Ron Howard, que, juntamente com quem investiu e promoveu este filme, agradece profundamente a atenção, claro.

Passando ao filme propriamente dito, há que dizer que é um filme ligeiro, feito pelo padrão dos filmes medianos americanos, que costumam misturar alhos com bugalhos (a gente aceita), muito ritmo e espalhafato visual; personagens que aparecem e desaparecem, actores em piloto-automático, bonzinhos que viram vilões sem ninguém perceber porquê, etc., etc. É o que se passa aqui, mais por culpa do escritor do que do realizador (segundo diz quem leu o livro, o filme está igualzinho ao livro) ... e, portanto, o filme ideal para as matinés televisivas. E, que diabo, é um filme de Ron Howard, não exijam muito mais, de acordo?

Nota final: Ian McKellen está excelente em 90% das cenas. Só mesmo quando o twist o atinge, a sua prestação soa tanto a falso que dá para pensar que os próprios actores não levaram a sério o filme.

terça-feira, maio 23, 2006

E a Vespa também faz 60 anos


Audrey Hepburn e Gregory Peck foram os seus melhores embaixadores, em «Roman Holiday» (1953). O engraçado aqui é que até os alemães (!) quiserem imitar a Vespa, com a também bonita IWL.

«No limiar da verdade». Importa-se de repetir?

Era uma vez uma rapariga americana que gostava de escrever romances de crime e mistério, e que se vê metida numa trama que deles tem em abundância, mas que não passa de literatura do mais light possível. Parece que essa rapariga tem andado por fora do circuito principal das fitas e filmes, pelo que resolveu apostar de novo nos fantasmas, só que desta vez em vez do barro que lhe deu fama, é a escrita inspirada pelos ares londrinos e britânicos, onde até Gales e a Cornualha viram Escócia e arredores maravilhosos de Iverness, só para inglês ver. Aliado a isto tudo há um argumento composto de cambalhotas e piruetas acrobáticas, as mais variadas, raiando a provocação ao espectador mais imberbe e/ou incauto, tal o grau de previsibilidade da coisa. No cômputo geral ficam duas certezas, já antes anunciadas, aliás: Demi Moore fica bem de boné, e os faróis são das coisas mais fascinantes que há. Ah, é verdade, a meia-luz do título original é tudo menos no limiar da verdade.

segunda-feira, maio 22, 2006

Qual o carro melhor actor de todos?

Vem aí a última loucura da Pixar, «Cars» de seu nome. E por isso aqui fica o desafio, em jeito de sondagem:

O Aston Martin DB5, de 007? O Lotus Elan de Ema Peel, em «Os Vingadores»? O Mustang 390T, de «Bullit»? O Volvo 1800 de «O Santo»? O Plymouth Fury, de «Christine»? Ou o Volkswagen de «Herbie»?

O bikini só faz anos em Julho ...


Mas dado o calor estival que se faz sentir por estas bandas, é natural que já andem a comemorar os 60 anos sobre a data em o francês Louis Réard desenhou a fatioca de banho em duas peças que revolucionou as mentes... apesar de ter havido na altura mentes que o acusaram de ostentação burguesa, porque humilhava a classe operária, uma vez que o seu bikini custava três vezes mais o salário de uma dactilógrafa. A piada está em que Réard só baptizou o dito cujo quando ouviu pela rádio que os americanos tinham feito um teste atómico no atol de Bikini. A seguir contratou a stripper Micheline Bernardini para o posar, e o triunfo foi imediato. No cinema tudo começou com Marilyn, claro, Rita, depois, e BB, em 1957. Mas para a posteridade ficou a «Bomba Anatómica» acima reproduzida, por culpa do Dr.No. Quanto ao atol, ele é hoje destino turístico privilegiado, por tudo o resto, mas também pelo bikini.

Chabrol em nítido desequilíbrio

Chabrol resolveu deixar o ruralismo francês, mais os seus crimes e dramas familiares escabrosos, para se dedicar aos corredores do poder, à corrupção e ao abismo que é a embriaguez do poder, que aliás é o título original de «A Comédia do Poder». Os piores receios confirmam-se ao fim dos primeiros 15 minutos: o território é escorregadio e mesmo um talento como o do veterano Chabrol pode estatelar-se ao comprido ... e foi isso que aconteceu, apesar de todo o brilhantismo da mise-en-scène, sobretudo a nível dos diálogos (é sempre um prazer segui-los em Chabrol), a direcção de actores (idem) e o humor cáustico e negro da relação juíza-marido. Um filme menor de um realizador maior.

Los olvidados #15: Vicent Sherman (1906-)

Não, este Sherman nada tem que ver com os tanques homónimos que rivalizaram com os Panzer ao longo de algumas décadas, nada disso. O olvidado a que me refiro é o prolífico e já centenário realizador de filmes para televisão e cinema, especializado em acção e aventura, muito romance e humor, de que o «Don Juan» com Errol Flynn é coroa de glória, e os romances com Joan Crawford e Rita, incontornáveis. Foi actor e dramaturgo, antes de tornar maus argumentos em bons argumentos, e filmes à partida medíocres em lucro certo para a Warner. As manias tontas de McCarthy haveriam de ter efeitos nefastos na carreira de Sherman, de que demoraria a reabilitar-se, não fora a TV. Foi um dos maiores artesãos de Hollywood, que nunca o viu para além de um rotineiro de serviço, pena.

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quinta-feira, maio 18, 2006

Parabéns a você: Dennis Hopper




Um dos melhores e carismáticos actores secundários de sempre, culto e influente, ainda por cima. Com um c.v. invejável, inclusive como realizador, fez ontem 70 anos de idade. O melhor papel de todos? O de Frank Booth, em «Blue Velvet», de Lynch (1986). I'll fuck anything that moves!

Chega ao fim sondagem "E a melhor gargalhada, foi com quem?"

Esa sondagem já se arrastava, pelo que lhe dei uma machadada final ... parece que os meus visitantes gostam mais de um susto que de uma gargalhada, pois votaram menos de metade desta vez. O rei incontestável é Chaplin, com 9 preferências. Seguido dos Monty Python com 7. Sellers e Tati vêm lá atrás, cada qual com 4. Se tivesse sido eu a votar, o resultado seria: todos por igual.

Aí está Cannes 2006!

Aos sortudos dos cinéfilos, jornalistas e curiosos que puderam ir até lá, que não se fiquem pelos filmes. Dêem um pulo a Antibes, Cagnes-sûr-Mer, St. Paul de Vence e, sobretudo, Nice, Villefranche-sûr-Mer e Menton. E vale a pena um bom guia com dicas sobre celebridades do cinema!

quarta-feira, maio 17, 2006

Venha daí o Flash Gordon, s.f.f.



Só agora me lembrei: perdi a emissão da bio de Alex Raymond (que é como quem diz: Flash Gordon), exibida em horário indecente pelo Biography Channel. Mas estou descansado pois para além da bd que já tenho (ainda que incompleta), descobri em loja de Lisboa a colecção total de filmes e curtas que se fizeram sobre o herói que pretende libertar Mongo da tirania de Ming. Cinematograficamente falando, nunca houve melhor Flash que Buster Crabbe. E o amigo das escadinhas da Calçada do Duque que se ponha a pau e reedite a totalidade das pranchas de Raymond, s.f.f.

Nota da redacção: Foi intenção desta gerência a não inserção de fotografias, desenhos ou qualquer outra imagem. Mas se o grafismo dos profissionais muda, porque não o dos amadores? Eis, portanto a primeira de muitas mais.

Às 16h, mesoterapia com Brenda?

Vamos a ver no que isso dá. Se fosse a nossa preferida Brenda, da fabulosa série que é «Six Feet Under», estaria 100% seguro quanto aos resultados nesse teu feixe de músculos. Assim, tenho as minhas dúvidas. Já agora uma pergunta: por que achará quem manda que é luxo ter-se massagens, ou preencher-se as brancas de gengivas desdentadas?

Curiosidades: O 707 de Travolta

Parece que Travolta é o único americano a ter um Boeing 707 à porta de casa. Assim o refere a imprensa. O seu rancho, o Jumbolair, na Florida, tem uma pista e um terminal como se fosse uma cidade. Parece, também, que a paixão pelos altos vôos vem de infância por ter crescido à beira de um aeroporto. Terá sido uma dádiva da Cientologia? Que acharão os meus vizinhos disto?

terça-feira, maio 16, 2006

Los olvidados #14:Jacques Feyder (1885-1948)

Disse dele próprio a Le Figaro, em 1924: "Je suis né à Bruxelles le 21 juillet 1885 à 9 heures du matin, salué par une salve de 101 coups de canon : c’était le jour de la fête nationale belge !" ... mas acabaria por se naturalizar francês em 1928, 13 anos depois de ter entrado nos estúdios Gaumont. onde começou como actor. Este é um dos pais do realismo que, apesar de tudo, menos filmes nos deixou, por entre as quase cinquenta curtas e longas-metragens que realizou, porque muitas delas já são consideradas irremediavelmente perdidas. A crítica sócio-política, as crianças, o amor, Wagner, a literatura (a começar pela de Hugo, de quem era amigo) e o domínio da técnica de realização fizeram dele muito apetecível por Hollywood, onde chegaria aos 44 anos de idade para realizar um dos da Garbo, «The Kiss». Os seus filmes podem resumir-se ao seguinte binómio: luz-ritmo. Feyder é um dos grandes clássicos mundiais que importa (re)descobrir quanto antes, a começar por «La Kermesse héroïque» (1935), para muitos a sua obra-prima.

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Resumo de livro acabado de ler: pura verdade. E é um bom precedente.

She wants to leave the mark of her desire on every living creature (...) if she were Caesar, she'd do it with a sword. If she were a poet, she'd do it with words. But she's Lilith, so she has to do it with her body. («Lilith», 1964)

segunda-feira, maio 15, 2006

A esta terra de liberdade digo "não"

«Freedomland» torna-se gradualmente insuportável à medida que vai sendo mais do mesmo, ou seja, este filme de Joe Roth - que nem sequer chega a aproveitar os actores que tem,deixando-se cair na exploração fácil dos esteréotipos associados a Samuel Jackson e Julianne Moore - cedo se torna em filmezinho caseiro feito em circuito fechado, «a modos» que um ilme de Spike Lee mas básico, primário, e entediante. De facto, desde personagens secundárias que aparecem e desaparecem à vontade do freguês, sem terem sequer tempo de aquecer o lugar, a tensões sociais e raciais, já vistas e revistas por melhor prisma, de tudo há um pouco nesta confusão geral que assolou o filme, à semelhança, aliás, da confusão que se gerou no próprio bairro que dá origem à trama, com o rapto que virou crime por negligência, de contornos libido-raciais, etc. e tal, que sempre convém apimentar estas coisas passadas nos bairros problemáticos. A evitar.

Foi você que pediu um freak?

Wes Craven revisitado pelo próprio, mas por portas travessas - Alexandre Aja. não com mais um daqueles «director's cut» -, não em «versão original» mas antes em versão depurada e apurada. Ou seja, «The Hills Have Eyes» é o expurgo das coisas mais dispensáveis da versão de Craven dos anos 70, ganhando agora um cunho mais explícito, mais gore se se quiser. O filme está muito bem feito, a todos os níveis, apresentando soluções de câmara e cénicas bem achadas, sem nunca perder o pé,. Não deixa, contudo, de ser totalmente previsível enquanto história macabra de «família vítima da sua própria estupidez».

O habitual «filme baseado em acontecimentos verídicos» é aqui encapuçado pelas histórias mirabolantes, umas verdadeiras e outras falsas, que têm sido escritas e documentadas sobre os efeitos dos testes atómicos que os americanos fizeram pelos seus desertos, provocando aberrações várias nos descendentes das populações das áreas limítrofes. O puro terror da primeira hora vai caindo à medida que nos vão sendo apresentadas as criaturas horrendas que habitam uma aldeia-teste esquecida por entre crateras de antigas detonações atómicas, e que, por artes mágicas de um gasolineiro medroso não se sabe bem do quê, vão sendo alimentadas (literalmente) nos seus festins de morte, esquartejamento e deglutinação de tudo quanto é encaminhado até si, num festival de sangue, cicatrizes e deformações que fariam inveja ao circo mais demente de Browning ou Maddin.

Um Scorsese anti-rotina

Ontem, revi televisivamente de «After Hours» (1985), filme que jurei um dia a mim mesmo serviria de base de apoio a eventual filme da minha autoria, que ficou pelo caminho, nos entretantos da vida. Continua a ser um grande filme, resistente ao tempo. Sem sombra de abrandamento de ritmo, por entre arrebatamentos de câmara e com um argumento que é um genial manifesto anti-rotina.

Bife a quanto obrigas

Mil desculpas pela ausência forçada. Motivo: não nos tirem o bife à Café Império!

quinta-feira, maio 11, 2006

McQueen é eterno

E a notícia do leilão que a sua 3ª mulher acaba de anunciar anunciar, sobre muitos dos objectos que o saudoso actor tinha (motos, óculos escuros, etc.), é a prova provada disso mesmo. Para mim, na impossibilidade de adquirir a moto da fuga de «The Great Escape» (1963), um baralho de cartas de «The Cincinnati Kid» (1965), o Mustang ou o coldre a tira-colo, de «Bullit» (1968), o planador, os óculos escuros ou o jogo de xadrez de «Thomas Crown Affair» (1968), o fato-macaco e o capacete de «Le Mans» (1971) ou a gabardine e a caçadeira de «The Getaway» (1972); o livro de fotos de Willam Claxton é obrigatório, assim como os seus filmes quase todos. Desapareceu há 26 anos. Saudade!

Tom Hanks e eu

O actor de «Espião do Sapato Vermelho» anunciou recentemente a um jornal alemão o seu top 5. Estamos de acordo quanto ao primeiro dos primeiros. Mas destoamos quanto ao resto. Na hipótese improbabilíssima da revista me querer entrevistar, direi: 1. «2001, Odisseia no Espaço». 2. «Blade Runner». 3. «Excalibur». 4. «Brazil». 5. «Apocalypse Now» (e batam-me, s.f.f). Mas há mais cinco e múltiplos de cinco, até ao infinito (+ e -). Há gravador que chegue para a entrevista?

quarta-feira, maio 10, 2006

Sarah (T.) Connor?

Uma nevrite é uma inflamação dos nervos. Uma tendinite devia significar em português uma inflamação dos tendões, mas o diccionário não a reconhece como sendo uma palavra portuguesa. Muito menos a uma «ombrinite». Coitadinha: devem dar-te ganas de, à semelhança do «Terminator», de Arnie, abrires a pele e reparares esses fios, circuitos e mecanismos maravilhosos do teu corpo. Falta pouco para a água do mar tudo sarar.

Há que conferir a Cinemascope, ao Príncipe Real

Já foi tempo em que andava possesso (há 30-35 anos?) pela cave da discoteca Sinfonia, na Avenida de Roma, e pela discoteca das Arcadas do Estoril, onde caçava posters vários, de cinema, principalmente. Mas nicles, quase nada conseguia, à excepção de um fantástico de Marilyn, sentada, em «Bus Stop», ou de um de Bo, à beira-mar, em «10». Hoje, ao virar de cada esquina as coisas vão-se compondo. Acabadinha de chegar ao mercado (oxalá sobreviva) está esta loja ao Príncipe Real. Como é recomendada por amiga, consultei-a na Net e parece que vale mesmo a pena. A conferir in loco, na Rua do Monte Olivete, no nº 40, das 14h às 20h (aos Sábados abre às 10h30m).

Simplesmente Maria

É confragedora a inabilidade de Abel Ferrara quando sai do escuro e dos néons da noite nova-iorquina. Por isso, mesmo que se compreenda que a fase do misticismo calha a todos, algures nesta vida, vê-lo a alinhar pela tese da discípula Madalena, fazendo coro com o culto a que alguns nos querem fazer entrar, faz-nos perdoar-lhe todos os excessos dos policiais do seu c.v. Aqui, nem mesmo a inspirada, mas desadequada, música de Francis Kuipers ou actores da estirpe de Juliette Binoche e Forrest Whitaker salvam o chorrilho de palermices pegadas, que vão desde o regresso às origens de uma Binoche tocada pela luz, à mulher grávida do jornalista atirando-nos à cara com "este é o meu sangue", etc., etc. Tão confrangedor é o filme que assume pose de pretensioso, fazendo com que «Mary», que podia ser um belo objecto de reflexão sobre a fé, e de pura teologia, seja assim apenas um filme de culto, coisa de seita, em que 83m mais parecem 183.

The Chinese shop around my corner

O mundo foi invadido de lojas chinesas um pouco por todo o lado. Perto de mim, convivo diariamente com dezenas delas, tantas que já lhe perdi a conta. Fecham e abrem à medida que fogem aos impostos. Ali em Entre-Campos a clientela virou marabunta. Eu só lá entraria se fosse atendido pela Gong Li, me vendessem estatuetas genuínas de terracota, ou se pudesse comer os patos lacados da Chinatown londrina. Como isso não acontece passo a 1,5m de distância, sempre.

E se Buñuel me fizesse casting?

Há dias em que me imagino convidando para jantar alegórico, faustoso, inolvidável e barroco, todos quantos me pregaram partidas, desde que nasci até hoje. E já me vejo anjo exterminador, jogando com eles ao gato e ao rato, puxando os cordelinhos de uma encenação transcendental. Surrealista?

segunda-feira, maio 08, 2006

L' amour fou

13 anos.
Par gourmandise.

Cruise e pouco mais

Fazer de «Missão Impossível» algo de novo é mesmo quase missão impossível. Que o diga Tom Cruise que teve que fazer da sua personagem a figura central de «M:i:III», o que lhe custou ficar com um filme que, embora sendo puro entretenimento como os que o precedem, sai nitidamente da bitola, do padrão dos filmes e da série que conhecemos: a espionagem, a contra-espionagem, o alto risco, os artefactos, as engenhocas, a pandilha, tudo isso é esquecido, e tudo passa a filme de acção, de rapto, chantagem e perseguição pessoal. Este é o filme de funalização da acção, e tão funalizado é que vira endeusamento. Os produtores podem ter achado que seria esta a saída, mas já devem estar arrenpendidos.

Outra coisa é dizer-se que Tom Cruise não está em forma, que o está, e tão em forma está que a partir dos primeiros 20m se fica com a sensação que não fora Cruise e o filme seria uma coisa igual a mil outras coisas que Hollywood deita cá para fora à razão de cem por dia, pouco mais que medíocre. O homem está aí para as curvas e a melhor prova disso mesmo é que até Seymour Hoffman é pulverizado em todas as cenas em que contracena com ele, restando-lhe pouco mais que aquela soberba insinuação à agente, quando já metamorfoseado se insinua para ir de Lamborghini.

As melhores sequências do filme são as que preenchem o "assalto" ao Vaticano, mesmo completamente parvo, e é mesmo só aí que o filme é pura bitola "M:I". No resto é um filme de acção com algumas sequência brilhantes (ex.Cruise disparando empranchado fora do carro, Cruise caindo de pára-quedas e o resgate de Seymour Hoffman em plena ponte) que roda à volta da própria vida do Cruise, pelo que o encanto das missões impossíveis sai defraudado. O argumento fraquito, a realização sem chama e demasiadas inverosimilhanças fazem com que tenhamos saudades da "M:i:II" e de John Woo.

Quando um cão vence uma raínha cantora

Vale mais o episódio do atropelamento do Grand Danois a um Rousseau velho mas não trôpego, em "Les rêveries du promeneur solitaire" (1782), do que toda a cronologia romanceada, mesmo que fundamentada, de
"Condessa d' Edla-A Cantora de Ópera quasi Rainha de Portugal e de Espanha", de Teresa Rebelo (Editores Aletheia). Uma desilusão.

Novo Mundo: a colonização da beleza

«A New World» é o mais recente capítulo de Malick no seu ensaio pela sublimação da beleza, da beleza dos elementos, da virgindade, dos sentidos, da pureza, do amor tout court. E como capítulo que é vem encadeado numa sequência de capítulos semelhantes, que começaram no território gangster, passaram pelos prados de trigo, foram até ao Pacífico e agora chegam à colonização da Virgínia, por via do amor impossível entre um bravo inglês e uma indígena, cúmplice dos elementos. A história é conhecida de todos: trata-se do romance, mil vezes citado, de John Smith e Pocahontas.

O tema em si pouco parece interessar a Malick, senão pela rama, já que o que ele gosta de filmar mesmo são os grandes planos de rostos, de olhos, de gestos, suportados em longos e poéticos monólogos em voz off. O que interessa a Malick é o vento arrebatando as ervas altas, as folhas. O sol emoldurado de negro, iluminando os actores como telas. A música de fundo de Wagner, envolvente, arrebatadora; de tempos a tempos uma passagem mais ligeira, melodiosa, é Mozart dedicado aos amores de casal. E nisso, o seu cinema é imbatível, tal qual as sequências em que Pocahontas está sozinha.

E o resto? O resto pouco importa a Malick. Pouco lhe importa que o filme esteja suspenso, sem base, mais parecendo que foi um filme mutilado por vontade dos estúdios ou de terceiros. Pouco lhe importa que as capacidades de Farrell sejam sub-aproveitadas, tal qual as de Bale e as de Plummer. Ou que as imagens sofram de déjà vu, e que a participação de James Horner enquanto músico seja uma redundância. Ou que o espectador se estire na cadeira. Ou que a história fique suspensa e sem, aparentemente, quase nenhum senso. Pouco importa a Malick que no final da minha sessão, alguém tenha dito ao amigo: "o problema de se vir ao cinema é que não se pode fazer zapping".

sexta-feira, maio 05, 2006

Na praça central, com a banda a tocar

Há dias, semanas, naquela praça a pouco mais de 1h daqui, fechámos os olhos ao som da banda da sociedade filarmónica local. A música era quase imperceptível por entre o cacarejo das mulheres e dos homens sentados, e em pé, encostados aos plátanos. Mesmo sem coreto, mas com a miudagem debruçada às janelas, rindo, ou espicaçando o cachorro do vizinho e comendo gelados, e com aquela brisa marítima a varrer-nos os pés, fechámos os olhos e vimo-nos num daqueles filmes de Ophuls, Carné ou Pagnol, que ainda existem na realidade.

Só pelo esforço de Tom Cruise ...

Vale a pena ir ver «M:i:III». O homem esteve anteontem em 4 ante-estreias em Nova Iorque, em 4 horas. Para ir a todas sem atrasos, usou carro, moto, barco e helicóptero. No final disse: «mission accomplished». Veremos em breve se assim é.

Help me! Help meeee!

Há pouco, eu e tu contra 5 moscas, qual Eurico Lampreia (o nosso maior forcado das últimas décadas) e Enrico Ponce, fizemo-las sentir, a essas quase inúteis - não fora serem fast food para aranhas e demais bicharada -, tal qual Vincent Price as sentiu, em «The Fly» (1958)

quinta-feira, maio 04, 2006

«Action Man» na prateleira

Do pára-quedas, dos capacetes, das fardas, do escafandro, das botas, dos 2 bonecos de cabeça rapada e dos 2 de cabelo e barba, e de todos aqueles artefactos de dar tiros, fazer buracos, fazer mergulho, trepar pedregulhos, montar tendas, etc., e depois de me terem roubado um, e de eu ter estropiado outro, e perdido um outro electrocutado em fio de poste de electricidade (está-se mesmo a ver qual foi...), resta apenas um, em caixa quase intacta: o meu alpinista de camisola de gola alta beije, calça azul de flanela, cabelo e barba ruiva de alcatifa, botas de alpinista, mas sem mais nada que não as mãos, os pés, os braços, as pernas e a cabeça terrivelmente bem articulados. Ah, sim, ainda há por lá um capacete branco, de pára-quedista, solto, e um fato-macaco encarnado. Um dia alguém brincará com o ele, sim com este barbudo!

When Steven doesn't like what I wear, I take it off!

Por falar em Joan Collins, esta é uma das suas réplicas mais certeiras, enquanto Crystal, amante do marido de June Allyson, Kay Hilliard, em «The Opposite Sex» (1956), a um comentário desta última sobre a sua indumentária, que aqueloutro não aprovaria.

quarta-feira, maio 03, 2006

Hoje, às 19h, na Cinemateca, Joan Collins vai dar cabo da cabeça de mais uns quantos...

"zwingando" em baloiço de veludo vermelho, na pele da modelo (verídica) Evelyn Nesbit, que em princípios do Séc. XX foi manchete dos jornais, inspiração para peças e vários filmes, entre os quais este, que o recém-falecido Richard Fleischer resolveu filmar com o fôlego que lhe era reconhecido, em «The Girl in the Red Velvet Swing». Em princípio, por razões que a própria razão desconhece, estaria impedido de o ver, mas como não me dei por vencido lá estarei.

Uma está superlativa, mas há mais

Uma Thurman está superlativíssima (pode parecer exagero ou redundância mas esta é a derivação de maior grau para o adjectivo superlativa...), como sempre, aliás, mas há mais, há efectivamente mais, muito mais neste filme da competentíssima Susan Stroman, grande coreógrafa da Broadway. Aliás (outra vez) há quase tudo quanto se pode almejar para um musical do antigamente: canções bem feitas, música a condizer, bastante humor, coreografias imaginativas, guarda-roupa e cenários espampanantes, personagens bem achadas, actores versáteis e que sabem estar em palco, história apelativa, muito ritmo e alguma dose de loucura.

E «The Producers» tem tudo isso, apesar de começar algo frouxo, talvez porque tudo quanto é de Mel Brooks é mesmo assim (como a coca-cola segundo Pessoa): primeiro estranha-se, depois entranha-se. É portanto oportuníssima esta versão cinematográfica do sucesso homónimo da Broadway, já de si uma adaptação de um filme algo esquecido do autor de «Frankenstein Jr.».

Uma palavra extra para Will Ferrell: o homem está cada vez mais cómico e, por este andar, o que parecia ser uma imitação de Lewis arrisca-se mesmo a ser o único grande actor cómico norte-americano ainda em plena ascensão.

terça-feira, maio 02, 2006

«Running Scared», não é para levar a sério mas convém ver

Uma grande, grande surpresa, este filme da escola Tarantino - turma Guy Ritchie (se bem que com protocolos com a de Spike Lee e a de Christopher Nolan) - que apetece aconselhar a todos quantos lhes tem passado despercebido semelhante filme, por incúria dos comentadores, distribuidores e exibidores. O filme é mesmo bom e talvez faça o seu próprio spin-off um dia destes. Não há que ter receio de cair numa daquelas experiências parvas a que Hollywood nos habitua de quando em vez, no sir, este é mesmo um bom filme policial.

O mote é-nos dado logo ao início quando num Mustang à la MacQueen um adulto e um miúdo fogem de um edíficio. Há sangue a brotar, não se sabe bem de onde, mas nunca é kitsch. A câmara vai ao ombro e raramente descamba em exercício presunçoso. A fotografia é fortemente escura e nunca desbota. Que se terá passado nas últimas horas para que aquela cena seja assim? E que desfecho terão as personagens? Uma típica história dos anos 40-50 que lembra Aldrich ou Siodmark, mas que tem todos os ingredientes de agora: uma realização sem mácula, bem alicerçada em efeitos especiais em estado de arte (que nos trocam os olhos), flashbacks e flashforwards (conforme a ocasião), planos parados sobre planos em movimento, muito jogo do gato e do rato, e um colt que passa de mão em mão de personagens, qual delas mais à la Rodriguez. A excelência das interpretações faz o resto, sobretudo o menino que desconcertava Nicole, em «Birth», Cameron Bright; Vera Farmiga, Chazz Palminteri, e, porque não, Paul Walker.

Obituário: Glicínia Quartin (1924-2006)

Quem sou eu para falar desta excelente e quase olvidada actriz? Do seu curriculum, fala quem sabe, i.e., Jorge Silva Melo, via Artistas Unidos e o Centro Nacional de Cultura. Uma grande senhora.

Ia jurar que tinha visto Nastassja Kinski

Neste fim-de-semana enquanto uns se preparavam para erguer qualquer um dos punhos, outros dois pavoneavam-se pelo zoo de Lisboa cada vez mais bonito e cuidado (estou a falar da zona para lá da bilheteira, claro!), julgando mirar no novíssimo pavilhão dos felinos ainda em construção, por entre as ruínas de civilizações milenares e restos de troncos e trepadeiras, leopardos e panteras negras, ao som de Bowie, em versão lisboeta de «Cat People» (1982). Ia jurar que tinha visto Nastassja Kinski.

Brosnan a descolar-se de Bond

Pierce Brosnan é um bom actor e não pode virar remake de Roger Moore, ficando-se por papéis secundários e pela memorabilia do costume. Por isso, mais do que uma comédia negra amalucada, sobre um simpático assassino de empresários, em crise existencial, malcriadão, inoportuno mas terrivelmente certeiro (em todos os campos), este «The Matador» é um excelente indício do que Brosnan poderá fazer no pós-Bond ... mas de boas intenções está o inferno cheio, pelo que Brosnan terá que encontrar maneira de produzir algo mais do que auto-paródias, até porque parte do sucesso deste filme reside na boa parceria com Greg Kinnear e Hope Davies, e esse tipo de ajuda pode esgotar-se. De qualquer modo, trata-se de um bom divertimento, feito de acção sem pontos mortos, com um argumento simples e eficaz, tal qual a montagem e a banda sonora.